quinta-feira, 17 de março de 2011

Sabe bem pagar tão pouco (ou a arte de fugir ao fisco de Janeiro a Janeiro)



aqui havíamos falado da Jerónimo Martins e da sua manifesta arte para fugir ao fisco.

Sabemos agora que o grupo de distribuição alimentar, controlado por Alexandre Soares dos Santos (que este ano entrou para a lista dos mais ricos do mundo) e em cujo Conselho de Administração se encontram "distintos" apoiantes da recente recandidatura de Cavaco Silva, perdeu em tribunal um processo judicial por fraude fiscal e fuga ao fisco no montante 20,88 milhões de euros de IRC

O esquema, envolvendo diversas operações financeiras e várias empresas ligadas ao grupo, revela as habituais "engenharias financeiras" dos grandes grupos económicos, que apregoam aos sete ventos a ética empresarial e a responsabilidade social mas que recorrem a todos os artifícios para maximizarem os lucros e minimizarem o contributo fiscal que justamente deveriam pagar.

Alexandre Soares dos Santos, um frenético defensor da intervenção do FMI em Portugal, é o retrato exemplar desta classe empresarial que enche a boca com palavras como "empreendedorismo" e "iniciativa privada", ao mesmo tempo que defende "menos estado", "menos direitos", "mais flexibilidade laboral"...

É caso para dizer que o slogan publicitário "sabe bem pagar tão pouco", de uma das cadeias de supermercados da Jerónimo Martins, reflecte na perfeição o conceito do grupo empresarial liderado por Alexandre Soares dos Santos

É deste modo que se constroem grandes fortunas, ao mesmo tempo que se apregoam falsas virtudes...


8 comentários:

  1. Como se faz um dono de Portugal
    Apesar da crise, em 2010, o 'rei' da cortiça ficou 800 milhões de euros mais rico, enquanto o patrão da Jerónimo Martins viu os seus bens reforçados em 635 milhões, o que lhe deu entrada directa no pódio dos mais ricos em Portugal.

    O capitalismo de supermercado, de rendas fundiárias e de privatizações contra o interesse público vai de vento em popa – Amorim é o ‘rei’ na Galp, graças à participação adquirida a preço de saldo. E que tal um imposto sobre as grandes fortunas? Nem pensar. O que é preciso é tentar fugir aos impostos como se faz no sítio do costume: tribunal dá razão ao fisco e considera que o grupo Jerónimo Martins tentou fugir ao IRC. Acompanhemos então Cavaco Silva e António Barreto e demos vivas ao empreendedorismo e à responsabilidade social da nossa elite económica. Esta aguarda ansiosamente a entrega de novos serviços e infra-estruturas públicas ainda por capturar e isso exige, como é sabido, pesados investimentos na luta das ideias.

    Postado por João Rodrigues às 16.3.11

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  2. Voltamos sempre à mesma economia imoral

    Podemos identificar dois tipos de economistas: os que discutem os problemas da economia portuguesa no quadro da zona euro e dos seus disfuncionamentos e os que fingem que o nosso país pode ser pensado de forma isolada, ou seja, no quadro de regras que não querem questionar porque sabem que estas favorecem o seu discurso neoliberal apostado em transformar a provisão pública em negócio privado para grupos económicos desesperados. Assumido pelos austeritários do bloco central, incluindo um Cavaco que no seu discurso de tomada de posse não referiu uma única vez a questão europeia, o moralismo das finanças públicas é hipócrita e equivocado, para além de ser estreito. É hipócrita porque os economistas que defendem reduções das despesas sociais, reduções dos direitos laborais e correspondentes cortes salariais, o tal todos temos de fazer sacrifícios, fazem parte dos 5% mais ricos de um dos países desenvolvidos mais desiguais. É equivocado porque o Estado não é uma família e quando se comporta como tal onera as famílias realmente existentes com quebras do rendimento e com desemprego: o estado das finanças públicas quase só depende do andamento da economia.

    A abordagem dos balanços financeiros sectoriais ajuda a entender isto: a soma dos saldos dos sectores externo, público e privado, tem de ser igual a zero. Não há como fugir disto. Num contexto de crise, com o saldo do sector externo mais ou menos constante, é evidente que o esforço dos privados para reequilibrar os seus balanços, com cortes no consumo e no investimento, tem de gerar inevitavelmente um aumento do défice público. Sabendo que o inserção dependente da economia dificilmente permitirá grandes reduções do défice externo, então o contraproducente esforço, pela dimensão e prazo, para reduzir o défice público, a ser bem sucedido, o que se duvida, teria como contrapartida um aumento do endividamento do sector privado. Por algum lado a corda vai ter de partir com a contracção da economia.

    Neste quadro, entendemos melhor a natureza da economia política da austeridade e das alternativas também se a inscrevermos, como faz de forma informada o economista keynesiano Engelbert Stockhammer no seu ultimo artigo, numa zona euro construída para fazer do trabalho, concebido apenas como um custo a economizar, a principal variável de ajustamento à crise. Isto num quadro de desequilíbrios comerciais, em que os excedentes dos países centrais são os défices dos periféricos, sem mecanismos de suposta correcção que não passem por processos deflacionários brutais como os que estão a ocorrer na periferia. Juntem-lhe a financeirização do capitalismo e têm a tempestade perfeita: crise e mais crise, desemprego e mais desemprego. E um moralismo económico imoral.
    Postado por João Rodrigues às 15.3.11

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  3. A melhor das políticas possíveis

    Referindo-se ao Sacro Império Romano-Germânico, dizia Voltaire que este não era “nem sagrado, nem romano, nem império”. Pois nós temos um Programa de Estabilidade e Crescimentoque não é de estabilidade, nem de crescimento, nem um programa.

    Não é um programa porque não assenta numa visão estatégica para a economia portuguesa que articule meios e fins, de modo a atacar simultaneamente os vários défices que a caracterizam (de emprego, de competitividade, de justiça social, de financiamento externo). Em vez disso, corta-se a eito sem olhar às consequências e procura-se apagar fogos com gasolina, mostrando depois surpresa quando estes ganham redobrado vigor. Tudo de uma forma tão ad-hoc que imagino que já nem os seus próprios executantes acreditem na exequibilidade das metas que anunciam a cada passo.

    Não é de estabilidade pois agudiza as tensões sociais e fomenta o medo e a insegurança na nossa sociedade. Facilita ainda mais o despedimento num país onde já reina a precariedade. Reduz os apoios sociais num país que já é dos mais desiguais da Europa. Liberaliza um segmento do mercado de arrendamento que é em grande medida ocupado por idosos de baixos rendimentos, colocando-os a um passo da indigência. Prepara o caminho para nova ronda de privatizações, submetendo mais e mais necessidades sociais à lógica do lucro e da capacidade para pagar.

    E não é de crescimento nem em termos conjunturais, nem em termos estruturais. Conjunturalmente, aprofunda a contracção da procura interna num contexto em que não é possível contar com a procura externa (as exportações), privando a economia portuguesa de qualquer tipo de motor que permita aproveitar a capacidade produtiva existente (de onde os níveis de desemprego com que nos deparamos e continuaremos a deparar).

    Estruturalmente, reforça ainda mais um modelo de organização produtiva terceiro-mundista, caracterizado pela precariedade (a que chamam flexibilidade), pelos baixos salários (a que chamam factor de competitividade) e pela desigualdade (apresentado como uma consequência natural do mérito e da ‘atitude’). Esquecem-se, claro, que não é a tentar bater a China no seu jogo que conseguiremos crescer ou, mais importante do que isso, construir uma sociedade em que valha a pena viver.

    Um Programa de Estabilidade e Crescimento que não é nenhuma destas coisas, executado por um Partido Socialista que não só não é socialista, como nem sequer é social-democrata. Maravilhas do duplipensar à portuguesa. E apesar de tudo isto, não falta, tal como no Cândido, quem proclame que se trata da melhor política possível no melhor dos mundos possíveis.
    Postado por Alexandre Abreu às 14.3.11

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  4. Interesses

    Diz-se que a história das crises financeiras é escrita pelos credores. Contra todas as aparências, o economista Patrick Artus argumenta que, na realidade, o poder negocial do governo alemão é reduzido porque quem comanda a economia alemã seria o principal perdedor em todos os cenários na periferia que não passem por instituir mecanismos genuinamente solidários na zona euro: a reestruturação da dívida atingiria os bancos alemães, a intensificação da austeridade ameaçaria as exportações alemãs, o esfarelamento do euro e as subsequentes desvalorizações cambiais minariam o projecto industrial exportador alemão. É claro que Artus parece assumir que os governos das periferias têm alguma estratégia negocial concertada para colocar o governo alemão perante as suas responsabilidades. Hipótese heróica quando ouvimos, por exemplo, José Sócrates declarar hoje todo ufano que as instituições europeias aprovaram e saudaram a decisão do governo em promover mais uma ronda de austeridade. E, no entanto, como muito bem afirma João Galamba, “esta política de austeridade que a Europa escolheu é economicamente errada e socialmente injusta”. Galamba acrescenta: “mas o governo português tem de definir as suas políticas partindo desse enquadramento (…) O governo tem feito o que pode para defender o interesse nacional.” O problema, como a intervenção de Sócrates ilustra, é que o governo parte e acaba no mesmo enquadramento desastroso e dentro deste é duvidoso que haja qualquer “interesse nacional” para defender.
    Postado por João Rodrigues às 14.3.11

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  5. Sabe bem pagar tão pouco
    por Andrea Peniche
    A sociedade Recheio SGPS, que integra o universo empresarial do grupo Jerónimo Martins (JM) - proprietário da cadeia de supermercados Pingo Doce - perdeu a primeira batalha para impedir a cobrança de 20,88 milhões de IRC.

    Para quem, como Alexandre Soares dos Santos, anda a pregar a ética empresarial, esta decisão veio confirmar diversos provérbios populares: Olha para o que eu faço, não olhes para o que eu digo; O hábito não faz o monge; Não bate a bota com a perdigota; Não há bela sem senão; As aparências iludem; Antes sê-lo que parecê-lo; Cara de mel, coração de fel; Com bom traje se esconde ruim linhagem; Nem tudo o que parece é...
    por Andrea Peniche

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  6. Quinta-feira, 17 de Março de 2011
    Helena André quer ir para Bruxelas com acordo que penaliza os trabalhadores

    O Governo quer ter na mão já na próxima terça-feira um acordo na concertação social que lhe permita apresentar-se em Bruxelas com uma promessa de mais flexibilização do mercado de trabalho em Portugal.
    Já sabíamos que Helena André queria reduzir o valor da indeminização dos trabalhadores, baixando de 30 para 20 o número de dias que um trabalhador recebe por anos de trabalho numa empresa, recebendo no máximo 12 meses de salário ou 145.500 euros (300 salários mínimos).
    Mas agora, e ao contrário do que o PS tem dito no Parlamento, nomeadamente aquando da discussão de projectos do PSD e do CDS que queriam mais precarização do emprego, o Governo quer ainda conseguir que o regime de contratação a prazo seja "revisto". Ou seja, o executivo de Sócrates quer que os contratos a termo deixem de ter um carácter excepcional e que a precariedade se torne regra.
    A CGTP já anunciou a sua saída destas conversações, visto que está demonstrado que não existe nenhuma tentativa de conciliação das posições entre patrões e sindicatos, e que o Governo pretende apenas destruir os direitos dos trabalhadores como já havia sido pedido pela Confederação Empresarial de Portugal e pela Confederação do Comércio e Serviços. A UGT, através de João Proença - líder desta central sindical e membro da direcção do Partido Socialista -, mantém-se nesta farsa e provavelmente assinará esta declaração de guerra aos trabalhadores.
    Parece que os ecos da manifestação de 12 de Março não chegaram aos parceiros sociais.
    Publicada por Precários Inflexíveis

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  7. A crise como teatro político
    Entra finalmente em cena a crise política esperada. E, sob o pano de fundo da crise económica, a austeridade encena-se como alternativa à austeridade. Daí que a tragicomédia da vida política portuguesa seja de má qualidade: um entretenimento ligeiro para fugir à realidade, previsível e pastoso.

    PEC, o enredo interminável
    PECado de surpresa, Passos Coelho afirma solenemente: o teatro acabou. E o número teatral sobre o fim do teatro parece resultar. Escreve um jornal de referência que a sala gelou. Apesar disso, todos sabem que a interpretação de Passos Coelho é fraca. Finge sofregamente não querer o PEC IV por calculismo político, para que seja já a sua vez de ir receber ordens da senhora Merkel. Por sua vez, Sócrates, que lhe tinha induzido a deixa, sabe como prosseguir a peça: o seu balão de oxigénio é o discurso “ou eu ou o FMI”, criador de instabilidade, o PSD será o filme de terror.

    A crise política é esta dramatização vazia, a cortina que esconde o pacto político profundo para emagrecer o Estado Social e fazer pagar a crise aos/às mais pobres. Dramática mesmo é a nossa vida de austeridade imposta. O PEC é já o enredo interminável de um filme de terror social. E os que se declaram protagonistas da vida política portuguesa são apenas candidatos a produzir as suas sequelas.
    (...)
    Teatro da rua

    Para além da instrumentalização passageira de Cavaco, os outros principais actores políticos vão fingindo que não se passou nada na rua. Talvez pensem que, se fingirem muito, a rua se esquecerá da força que sentiu. Talvez pensem que o discurso repetido da política da inevitabilidade há-de prevalecer. Talvez pensem que a televisão é o palco único possível da política e que esse palco é deles todos os dias. Mas o dia 12 de Março provou que a política pode mudar de palco. Provou que a inevitabilidade imposta se desfaz quando a vontade colectiva se afirma. Provou que a força de que não gosta destes enredos não está esquecida.

    O teatro da rua é a política de novo socializada. E só esta força pode derrotar a austeridade, a memória selectiva do autoritarismo e o desejo de colocar os lucros acima das nossas vidas.
    Carlos Carujo 17.3.11

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  8. O labirinto de Sócrates, o mitómano
    por Daniel Oliveira
    Que José Sócrates tem uma relação difícil com a verdade é coisa que todos sabemos. Mas a entrevista de terça-feira ultrapassou tudo o que poderíamos esperar.
    Na versão de Sócrates, o que foi apresentado e elogiado pela Europa não são mais do que propostas. É falso. São propostas fechadas. Que não foi negociado com a Europa. É falso. É a moeda de troca para garantir que o FMI não virá e que será encontrada outra forma de auxílio externo. Que está apenas a tentar precaver uma situação difícil. É falso. A situação difícil já aí está. Que está aberto a propostas da oposição. É falso. Qualquer proposta de oposição que seja mais do que um mero adereço impedira esse acordo com a Europa e, muito em especial, com a senhora Merkel.

    Na terça-feira, José Sócrates fez o que faz sempre, mas de forma ainda mais despudorada: simulou uma realidade que todos sabemos só existir nas suas palavras e construiu toda a sua argumentação com base nas suas próprias mentiras. É o que fazem os mitómanos. Só não sabemos se, como eles, Sócrates acredita nas suas próprias mentiras.
    As mentiras de Sócrates não fazem aumentar o défice ou as taxas de juro. Não é por temos como primeiro-ministro um homem em que a coincidência dos factos com as suas palavras só acontece por mero acaso que estamos na situação económica em que estamos. Infelizmente, a realidade é bem mais complexa do que isso. E o PEC que Sócrates apresenta, ditado pela cegueira europeia, não resolverá coisa nenhuma.
    Os danos causados pelas mentiras de Sócrates são outros, e também eles graves. Primeiro: todo o processo político é, com ele, um interminável quebra-cabeças. No labirinto de mentiras que ele próprio constrói tudo vai a dar a becos sem saída. E nesses becos, esbarramos sempre com a mesma chantagem: a da crise política. O segundo: de cada vez que o primeiro-ministro fala degrada a imagem das instituições democráticas. O contrato entre um eleito e os seus eleitores depende da credibilidade do eleito. Se nunca sabemos se o homem que nos governa nos está a dizer a verdade - se temos mesmo de partir sempre do princípio que nos está a mentir -, ele perde toda a autoridade moral para nos governar. E, sendo eleito, retira com as suas mentiras autoridade à democracia. E isso é relevante.

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