sábado, 4 de junho de 2011

Lido por aí... # 16

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Após uma campanha eleitoral em que PS, PSD e CDS se furtaram à discussão das grandes questões políticas e onde, mais uma vez, a comunicação social secundarizou ou ignorou as propostas e iniciativas dos partidos de esquerda, é fundamental que exerçamos o direito de voto conscientes do que está em causa nestas eleições legislativas.
Neste inútil dia de reflexão, sugerimos por isso a leitura de um texto de Miguel Portas ("O regime", publicado ontem no Esquerda.net), onde se aborda a importância da participação de cada um de nós nestas eleições e se sintetiza o que verdadeiramente se decide amanhã nas urnas:

1. O que está em causa nesta eleição é, desde logo, um programa de governo – o da troika. Desta vez, não há lugar ao habitual “prometo mas não cumpro”. Aquilo é mesmo um programa com medidas rigorosamente calendarizadas. Apesar disso, só a esquerda o discutiu. O tripartido que assinou o Memorando de cruz, mesmo desconhecendo o seu preço em juros, fez tudo o que pôde para esconder dos eleitores o elenco das malfeitorias que subscreveu. Só por isso não merecem o seu voto.

2. Ao contrário do que se possa pensar, não há nenhuma questão de governo nesta eleição. O programa da troika foi escrito e decidido em Bruxelas, sob conselho do FMI e do Banco Central Europeu, o nosso principal credor. Esse programa será diariamente monitorizado em Bruxelas e fiscalizado em Lisboa a cada três meses. Chamar “governo” à administração local responsável pela sua execução é no mínimo exagerado. Classificar de “primeiro-ministro” a criatura que irá a despacho, é, no mínimo, uma piada de mau gosto. Só surpreende como ainda há quem se candidate a tristes figuras. Mas isso é porque sempre existiram figuras tristes. Eles, os do meio, não merecem o seu voto. Não merecem, sequer, metade dos votos que têm obtido.

3. Na verdade, temos uma questão de regime, o que é bem mais do que uma questão de governo. Quem decide não vai a votos, antes se plebiscita através dos votos nos partidos colaboracionistas. Quem decide não é controlado, controla. Quem decide, abre e fecha a torneira das tranches de financiamento em função das condições políticas que considere úteis ou necessárias. Quem decide, numa palavra, são os credores. O regime saído desta relação de forças é um poder colonial. Há quem, em Bruxelas, deseje a nomeação de um alto-comissário, ou seja, de um “governador”. Não é preciso. Um poder sem rosto é bem mais eficaz. A política reduzida à burocracia atinge o seu esplendor: vende-se a si própria como técnica. Neste regime, o soberano é o eurocrata. Mas ele ainda precisa dos colaboracionistas para se legitimar. No dia 5 eles não merecem o seu voto.

4. A dificuldade desta eleição é com a abstenção. São muitos os que pensam não valer a pena ir votar porque já está tudo decidido. São homens e mulheres castigados pela crise, punidos pela vida, que desacreditam. São jovens condenados à precariedade, que lhes aparece como superior às suas próprias forças, ou idosos que vêm a vida a andar para trás e não encontram, dentro si, as energias para mais esta batalha. Todos, sem excepção, sabem que não irão votar contra si próprios. Mas todos, sem excepção, duvidam que valha a pena votar. O pior da troika, o pior do Protectorado é precisamente isto: pôr as pessoas a duvidar de si próprias e das virtualidades da democracia. Mas é precisamente esta a melhor razão para que ninguém lhes torne a vida mais fácil.

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