Sob o pretexto da crise económica, os últimos dias foram pródigos em episódios reveladores do crescente ataque aos direitos laborais e ao Estado Social.
Comecemos pela entrevista que a ministra do Trabalho e da Solidariedade Social concedeu, no passado fim-de-semana, ao Diário de Notícias.
Quando questionada sobre se defendia a utilização de trabalho temporário no Estado, Helena André não só afirma que “tudo o que está dentro da legalidade são instrumentos a que todos os parceiros têm que ter a possibilidade de poder recorrer”, caucionando o que já é uma realidade na Administração Pública, como ainda acrescenta: “Não sei se um emprego temporário é precário, porque é protegido em termos de direitos.”
Todos sabemos que o recurso ao trabalho temporário, por parte da generalidade do patronato, não visa fazer face a acréscimos temporários de actividade (fundamentação habitual para a sua utilização). Todos sabemos que o recurso ao trabalho temporário é apenas um expediente para manter na precariedade milhares de trabalhadores, facilmente descartáveis, mal pagos e com poucos direitos. Não ter a coragem de admitir a precariedade associada aos empregos temporários, incentivando até a sua utilização, revela ou um total desconhecimento da realidade ou uma tremenda falta de seriedade política.
No início da semana, o Banco de Portugal, através do seu último boletim económico, alerta para que as restrições no despedimento individual são a principal diferença entre a regulamentação do mercado de trabalho em Portugal e de outros países, defendendo uma reforma laboral que promova mais “concorrência” no mercado de trabalho.
Para além de defender o fim do que considera um «elevado» nível de protecção do emprego, o Banco de Portugal caracteriza também o actual regime de subsídio de desemprego como sendo «dos mais generosos entre as economias desenvolvidas».
As conclusões/recomendações do Banco de Portugal mais não fazem do que caucionar e incentivar a política económica e social que PS e PSD têm vindo a implementar. Invocar a necessidade de combater a crise como móbil para a redução das prestações sociais e a desregulação dos vínculos laborais, conforme propõe o documento, é a forma mais espúria de justificar a aplicabilidade de medidas injustas.
Por último, ficámos a conhecer o que já vinha sendo lentamente desvendado, a agenda ultra-liberal do PSD.
A proposta de revisão constitucional do PSD é não só um ensaio do seu programa eleitoral mas também um violento ataque ao Estado Social e aos direitos dos trabalhadores.
A nova liderança do partido, sob a batuta de Passos Coelho, aposta o tudo por tudo na destruição do Serviço Nacional de Saúde e da Escola Pública, escancara a porta à privatização de Serviços Públicos e não se inibe em introduzir a possibilidade de despedimentos selvagens.
No que diz respeito à flexibilização dos despedimentos, a simples substituição da expressão "justa causa” por "causa atendível", contém em si toda uma agenda política, obviamente já aplaudida pelos representantes do patronato.
Ao contrário do que o PSD afirma, não estamos apenas perante diferenças semânticas, mas sim perante um programa ideológico que visa aniquilar direitos consagrados constitucionalmente e acrescentar ainda mais precariedade à precariedade.
As declarações de Helena André, o boletim do Banco de Portugal e a proposta de revisão constitucional do PSD são apenas alguns dos indícios das medidas que oportunamente nos tentarão demonstrar como sendo inevitáveis no âmbito do combate à crise.
Parafraseando a campanha lançada ontem pelos Precários Inflexíveis, as nossas cordas não esticam mais… já estamos todos presos por um fio…
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