domingo, 19 de dezembro de 2010

No centenário do nascimento de Jean Genet


Jean Genet foi poeta, prosador, dramaturgo, autor de uma única obra cinematográfica. Filho de pai incógnito, abandonado pela mãe, escarrou nas instituições, no poder, na ordem, na moral, na autoridade, na religião. Fez a elegia dos excluídos e elevou a heróis os protagonistas da sarjeta social. Glorificou criminosos, ladrões, putas, chulos, as margens da sociedade. Conheceu os cárceres, os corpos dos homens, o sexo visceral. Foi amado por uns (Sartre, Beauvoir, Cocteau, Giacometti…) e odiado por quase todos os outros. Foi anti-colonialista, apoiante dos palestinianos, dos Black Panthers, dos Baader-Meinhof. Inspirou encenadores (as suas peças continuam a ser regularmente encenadas, incluindo em Portugal), músicos (Pop Dell’Arte, David Bowie, CocoRosie…), realizadores (Fassbinder, Todd Haynes…), escritores (Al Berto, Edmund White…). Subverteu, subverteu sempre.

José Manuel dos Santos publicou ontem uma admirável crónica sobre Genet (revista Atual, jornal Expresso, edição de 18 de Dezembro), que sintetiza de forma perfeita a importância literária da sua obra:
Na sua escrita (“Escrever é levantar todas as censuras”), o mais lírico e refinado francês vive com o mais duro e vulgar calão. Na sua teologia, as virtudes são o roubo, a traição e a homossexualidade (“Um macho que beija outro macho é um macho a dobrar”), vivida como transgressão e castigo. Excluído pelo nascimento, fez da exclusão o seu contra-ataque: o excluído exclui. Traído, trai. Tudo se inverte na sua contramoral: o pecado é a virtude e o profano é o sagrado. Genet é o santo do mal (“A santidade é forçar o Diabo a ser Deus”).
“Roubo” em francês diz-se vol e é também “voo”. Neste homem sem céu nem terra, mas com muitos corpos e muitas almas, o baixo e o alto juntam-se. As palavras roubam-se e acendem-se para queimar. Os corpos voam na fuga e no amor. Aquele para quem a poesia e o crime são irmãos, disse: “A minha vitória é verbal e devo-a à sumptuosidade das palavras.” Sem Genet, a literatura saberia menos dos homens – e de si.

No dia em que se celebra o centésimo aniversário do nascimento de Jean Genet (19 de Dezembro de 1910 – 15 de Abril de 1986), recordamos a sua obra eventualmente menos conhecida, a curta metragem “Un Chant d’Amour” (1950).
Única aventura cinematográfica de Genet, responsável pelo argumento, montagem e realização, apenas conheceu a sua estreia em 1975 e continua, até hoje, relegada a um relativo desconhecimento público. Descubram-na, revejam-na e façam o mesmo em relação à obra literária de Jean Genet.







2 comentários:

  1. Isto é mesmo provocação!
    A direita detesta.
    A esquerda ortodoxa também.
    Vocês gostam e eu tammbém.
    Ainda bem!

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  2. A esquerda ortodoxa ainda risca?
    Eu sou da esquerda e gosto...

    O anti-cavaco

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